quarta-feira, 25 de junho de 2008

Quadrilhas, mas não é festa junina


"ONGs irrigam campanha eleitoral"
Presidente da CPI afirma que verdadeiras quadrilhas existem no país para roubar cofres públicos

Jornal do Brasil
As articulações do senador Raimundo Colombo (DEM-SC), presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Organizações Não-Governamentais (ONGs), para dar sobrevida às investigações ainda não decolaram. Sem conseguir avançar sobre os dados bancários e fiscais das entidades envolvidas em uma delicada relação com o governo, o senador luta para desmontar as manobras governistas que levam a CPI, desde outubro do ano passado, a um marasmo. Em entrevista ao Jornal do Brasil, Colombo sustenta que mesmo sem conseguir expor as grandes quadrilhas que se disfarçam de ONGs por todo o país, a Comissão terá um papel fundamental no futuro ao propor um marco regulatório para o setor.
Há oito meses em andamento, a sensação que a CPI das ONGs deixa é de que ainda não disse a que veio. A criação da CPI já se justificou?
- Reconheço que temos dificuldades, mas a CPI está cumprindo seu papel. Dividimos os trabalhos em duas fases. A primeira foi a da evidência, da coleta de provas. Fizemos um amplo levantamento tentando montar um verdadeiro raio X do terceiro setor. Ao todo, são 300 mil entidades em todo o país e pelo menos 12 mil recebem recursos do governo federal. Fomos atrás de tudo, mas nem sempre tivemos ajuda. As informações, por exemplo, das ONGs que recebem recursos de estatais, apoio dos governos estaduais e até de órgãos internacionais nós nem sempre tivemos acesso. A segunda etapa é a investigação que estamos nos esforçamos para colocar em prática com o cruzamento de informações financeiras, mas também não está sendo um trabalho fácil.
O que tem dificultado a varredura nos gastos suspeitos?
- Desde o início defendemos a importância da quebra de sigilos fiscais e bancários para ajudar a comprovar o desvio de dinheiro público por meio das organizações. Mas o plenário da CPI, com maioria governista, tem impedido este acesso. Há um acordo com a base para termos acesso apenas às movimentações financeiras atípicas destas entidades no Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Poderemos verificar saque e depósitos acima de R$ 100 mil e, portanto, o avanço ainda é tímido e a CPI se enfraquece.
O que mais tem chamado a atenção do senhor durante as investigações?
- Há muita ONG séria, que trabalha e presta serviços realmente a uma população que o poder público nem sempre tem condições de atender. Mas também fica muito claro nesta nossa investigação que existe uma facção criminosa que se insere, se disfarça de ONG e causa um rombo incalculável nos cofres públicos. Já fizemos inúmeras projeções e não conseguimos fechar o prejuízo total.
Qual o papel do governo neste processo?
- Em toda esta história o que é mais significativo é o descaso dos agentes públicos. Não há critério na escolha, não há fiscalização, uma vez que os órgãos não apontam ao Tribunal de Contas da União as irregularidades identificadas por eles. Também não há cobrança de resultado. Você repassa o dinheiro para uma ONG cuidar de índios e não sabe o que aconteceu com o dinheiro.
Por que é cada vez mais comum identificarmos ONGs ligadas a políticos recebendo dinheiro público?
- É uma relação muito delicada. O que acontece é a mistura dos interesses políticos de alguns parlamentares com os eleitorais. Por outro lado a legislação das ONGs é frágil e facilita as irregularidades. Na prática, ainda não existem freios para que ONGs ligadas a políticos deixem de ser beneficiadas. O governo adiou a adoção de medidas porque estamos em ano eleitoral. Foi irresponsável. Nesse ambiente, são muito fortes as evidências de que o dinheiro destinado às ONGs irriga campanhas eleitorais.
Nos últimos meses surgiram novas suspeitas envolvendo centrais sindicais e o deputado Paulo Pereira (PDT-SP), da Força Sindical. A CPI vai tomar alguma providência?
- Já estamos tomando. Nosso levantamento tinha nos deixado em alerta em relação as centrais sindicais e as denúncias só reforçam a necessidade da CPI cobrar explicações das ONGs e da própria Força Sindical.
A CPI recebeu críticas por não ter um objeto específico de investigação com tantas denúncias a apurar. Mas de repente, com novas denúncias, as fundações de apoio às universidades públicas foram levadas ao olho do furacão. Foi uma saída dos parlamentares ou já havia um cerco a estas instituições?
- As descobertas sobre os contratos milionários da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos (Finatec), ligada à Universidade de Brasília, e a super lixeira do ex-reitor Timothy Mullholand, não poderiam ficar sem uma análise com lupa. E foi muito valida porque avançamos em muitos pontos e com a ajuda do Ministério Público aos poucos vamos identificando uma rede que age neste tipo de instituição. Temos indícios de irregularidades ainda não comprovados também em Pernambuco e no Rio Grande do Sul.
Há um movimento entre os governistas para encerrar os trabalhos da comissão investigativa até o dia 18 de julho, quando começa o recesso parlamentar. O senhor é a favor disso?
- Ainda temos muito o que construir. Precisamos dar uma reposta à sociedade. A oposição é contra esta proposta e vai tentar resistir e dar continuidade ao trabalho.
O que a CPI vai produzir ao final?
- Já estamos produzindo. O nosso principal resultado sem dúvida será a proposta para um novo marco regulatório voltado à fiscalização das ONGs que ficará a cargo do relator da CPI, senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) apresentar. Hoje, uma prefeitura é fiscalizada pela Câmara de Vereadores, que tem condições de punir imediatamente, pelo Tribunal de Contas do Estado, pelo Ministério Público, ela [a prefeitura] tem que cumprir a lei das licitações, a Lei 8.666/93. Para dar um cheque para comprar uma caneta precisa dar um cheque nominal, que você pode rastrear. A ONG não tem nada disso, ela está totalmente liberada.

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