domingo, 25 de maio de 2008

SOBRE PARIDADE E AVALIAÇAO DE PRODUTIVIDADE CIENTÍFICA: meia dúzia de questões.





SOBRE PARIDADE E AVALIAÇAO DE PRODUTIVIDADE CIENTÍFICA:

Meia dúzia de questões suscitadas pelo debate entre os professores Luiz Henrique Schuch (UFPel/ANDES-SN) e Carlos Roberto Pio da Costa Filho (IREL/UnB), acontecido na quarta feira 19/5/2008 no Anf.9 e convocado pela ADUNB.

Divulgo aqui brevemente os meus comentários à intervenção do professor Pio nesse debate.

Rita Laura Segato

O professor Carlos Pio colocou no centro do seu argumento contrário à paridade o fato de que, para ele, as universidades de ponta na pesquisa acadêmica, isto é, aquelas que apresentam os melhores resultados em produtividade científica, não têm eleição para reitor nem muito menos escolha paritária. Como exemplo, o professor mencionou o conglomerado de universidades do Estado da Califórnia, nos Estados Unidos.

O professor Pio afirmou a incapacidade dos estudantes para decidir, e sustentou sua afirmação no fato de que os alunos que freqüentam o CA do IPOL jogam totó, falam em voz alta e fazem competição de arrotos. Com relação aos professores, o professor Pio enfatizou que é o mérito acadêmico o que lhes confere autoridade e deve garantir-lhes uma maior parcela de poder, e fez questão então de interrogar ao seu opositor na mesa, o professor e veterinário Luiz Schuch, a respeito da sua titulação.

Depois de ouvir as excelentes intervenções de alguns estudantes e desconcertada pelo teor e a baixa civilidade dos recursos usados pelo colega na sua argumentação – em especial o recorte tendencioso do seu exemplo sobre o comportamento estudantil e as conseqüências desabonadoras desta escolha para o conjunto dos estudantes -, solicitei um turno para falar, e disse o seguinte, que gostaria de compartilhar neste blog:

1. O professor Pio desqualificou duas vezes sua própria fala ao se valer do comportamento dos freqüentadores do CA do IPOL e do fato de que seu interlocutor no debate não tem doutorado. Baste dizer que foi um grupo de professores doutores quem decidiu os desvios de fundos da Universidade de Brasília para compra de mobília luxuosa de uso pessoal e de enfeites de natal de alto preço como renas peludas e alces de perna mole (além de gastos de dinheiro público em serviços impronunciáveis durante viagens, que já são do domínio do Ministério Público). Infelizmente, comprovamos que titulação acadêmica não garante lisura na administração, e um REITOR é, antes que nada, um ADMINISTADOR.

2. A diferença CENTRAL E DETERMINANTE entre as Universidades que o professor Pio descreve como exemplares por serem “altamente produtivas” e “de ponta” e a nossa universidade não reside no fato de que aquelas não tem escolha paritária para Reitor. A diferencia CENTRAL E FUNDAMENTAL para entender a distância que nos separa dessas universidades são os investimentos estatais com que elas contam não meramente no âmbito da pesquisa científica propriamente dita, mas também para estimular a experimentação e ampliação do convívio democrático em campus. Nessas universidades que o prof. Pio chama de exemplares, ainda não sendo gratuitas e ainda nos casos em que são plenamente particulares, o investimento estatal para os avanços da pesquisa e da democracia nos campi é sideralmente superior ao investimento estatal em qualquer uma de nossas universidades.

3. Contudo, são essas universidades de orçamentos INCOMENSURÁVEIS com os nossos as que fixam e determinam, para nós, os parâmetros do que seja “produtividade em pesquisa” e resultados, mediante sua influência global também sustentada com empréstimos para a Educação concedidos aos nossos governos. Toda a medição de produtividade e de resultados nas avaliações dos nossos cursos emana de um parque acadêmico que, por sua abismal vantagem em termos de recursos define um padrão inatingível para nós. Nós entramos assim numa competição em que não controlamos NEM OS RECURSOS NECESSÁRIOS PARA QUALIFICAR NO PÁREO NEM AS PRÓPRIAS REGRAS QUE DEFINEM A COMPETIÇÃO!!!

4. A pesar disso, colegas, muitos de nós fecham os olhos e ACEITAM acompanhar a prédica de professores como o Carlos Pio, que insiste em validar os parâmetros globais, em cuja definição não participamos, MAS SOMENTE ACATAMOS. Esse acatamento significa que aceitamos medirmo-nos com instituições que contam com condições incomensuráveis com as nossas NA ARENA EM QUE ELAS NOS CONVOCAM E COM AS REGRAS QUE ELAS FIXAM PARA CONCORRER. É urgente revisar o que o professor Pio chama de “resultados” e criar parâmetros de produtividade que tenham significado a partir das nossas realidades. É urgente descolonizar os parâmetros e a própria concepção de avaliação e medição de resultados. É urgente formular um conjunto de regras que captem e, sobre tudo, ESTIMULEM A IMAGINAÇÃO INTELECTUAL E A CREATIVIDADE no ambiente em que nos toca viver, com suas limitações, mas, também, com suas particularidades e incentivos próprios: SEMPRE ESTIVE CONVENCIDA DE QUE EXISTE UM UNIVERSO DE QUESTÕES QUE SE PODE ENXERGAR / FORMULAR / PENSAR / PESQUISAR / DESCOBRIR / PROPOR DAQUI, e NÃO DE LÁ. Temos que rejeitar A DIVISÃO MUNDIAL DO TRABALHO INTELECTUAL, QUE NOS IMPÕE UNILATERALMENTE SERMOS PRODUTORES DE DADOS BRUTOS DE PESQUISA EMPÍRICA, MAS NOS IMPEDE SER FORMULADORES DE MODELOS TEÓRICOS. Temos que descolonizar as nossas universidades e isso demanda, NECESSARIAMENTE, DESCOLONIZAR OS PARÁMETROS E ÍNDICES DE AFERIÇÃO DE PRODUTIVIDADE E O CONCEITO DE RESULTADOS QUE SE IMPÓS A NÓS. O local do nosso trabalho é AQUI E AGORA: local, regional, nacional e sub-continental, PARA PODER SER UNIVERSAL E FAZER TEORIA.

5. Se é por falarmos em RESULTADOS, solicito aos colegas que considerem o seguinte: Aqui, na Universidade de Brasília, ACABA DE SE PRODUZIR UM RESULTADO DE CONTUNDÊNCIA INEGÁVEL. Esse resultado toca no cerne de toda a questão elaborada acima nesta mensagem, porque diz respeito a RECURSOS: recursos para pesquisa, recursos para ensino. E ESSE RESULTADO FOI PRODUZIDO NÃO POR NÓS, DOCENTES, E SIM POR ELES, OS ESTUDANTES, que muitos entre nós pretendem continuar alijando dos processos decisórios na nossa universidade. ELES, E NÃO NÓS, GARANTIRAM A RECONDUÇÃO DOS RECURSOS AOS SEUS FINS E O RETORNO À TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO. Se somos cientistas, devemos ser FIÉIS AOS FATOS e, neste caso, o dado que temos é o DADO HISTÓRICO E LOCALIZADO do nosso processo particular: FORAM NOSSOS ESTUDANTES QUE PRODUZIRAM ESTE RESULTADO. A eles nos referimos quando defendemos a eleição paritária para o próximo Reitor.

6. Ao futuro imediato devemos deixar a ESTATUINTE PARITÁRIA e uma discussão aprofundada e refletida dos prós e contras das formas eletivas existentes nos outros países de América Latina, como sugeriram os pronunciamentos conflitantes, porém igualmente interessantes, dos professores Graciela Doz e Juan Verdesio, durante o debate em questão.

Um comentário:

Carlos Pio disse...

Prezada Profa. Rita Segato,
Tomei conhecimento desta mensagem por um aluno do CA de Ciência Política que, indignado, procurou-me para dizer que o CAPOL jamais serviu de guarida para desordeiros.
Na verdade, o estudante está correto e seu texto errado. Tenho um vídeo do debate e posso fazer uma cópia que a senhora ateste que JAMAIS FIZ MENÇÃO AO CAPOL, mas a UM DOS CA'S LOCALIZADOS NO PRÉDIO DA FACE/FDIREITO. Preferi omitir deliberadamente de qual dos CA's se tratava justamente para evitar este tipo de problema. No entanto, como a senhora tomou a frente e postou sua versão das minhas palavras no debate, sinto-me na obrigação de corrigir-lhe. Tratava-se do CA de Ciências Contábeis-CACIC e o episódio narrado naquele evento não visava ridicularizar o alunado da UnB, como a senhora maldosamente faz parecer.
Gostaria de pedir-lhe que retire do seu texto a designação IPOL (Instituto de Ciência Política) como referência ao CA que foi objeto de minhas considerações.
Atenciosamente,
Carlos Pio